Em um mergulho onírico repleto de referências e loucuras, o criador de Epiléptico aborda o surrealismo com esplendor, inteligência e humor
André Breton, o fundador do movimento surrealista, está perdido: ele não tem mais o amor de sua vida, seus colegas foram embora e, acima de tudo, parece que perdeu o que fez do surrealismo o que ele é. Para investigar o que está acontecendo e encontrar a coisa indescritível que lhe foi roubada, ele contrata seu amigo, o detetive americano Nick Carter, personagem de folhetim criado no final do século XIX por J.R. Coryell nos Estados Unidos e que encantou a primeira geração dos surrealistas.
Viajando pelo tempo e o espaço em um entrelaçamento de cenários fantásticos, personagens distorcidos, mulheres fatais, situações perigosas, crimes e máquinas extraordinárias, Nick Carter sai em uma jornada que revela o surrealismo em seu ponto alto, com o intuito de recuperar aquilo que Breton denominou de “o ouro do tempo”, o personagem central de suas histórias.
Inusitado e encantador, Nick Carter e André Breton: Uma Investigação Surrealista é um passeio eletrizante pelo coração do movimento artístico que redefiniu o século XX, conduzido por um dos maiores nomes dos quadrinhos franceses, David B. — autor do clássico e premiado Epiléptico.
Enquanto a investigação de Nick Carter apenas sugere a busca pelo maravilhoso, há muitas referências à vida de Breton e ao surrealismo, tanto no texto quanto nos incríveis painéis criados por David B., que os fãs do movimento artístico se deliciarão em descobrir. Leitura divertida e instrutiva, vamos passear nos sonhos de Robert Desnos, visitar Nadja em um hospício, nos deparar com vilões fictícios do universo de Carter, como o doutor Quartz, e saber da desavenças com Salvador Dalí e Gala, sua companheira e ex-esposa de Paul Éluard. Além disso, a investigação explora a relação com outros nomes incontornáveis do movimento, como Louis Aragon, René Crevel, George Bataille e René Magritte, sem falar em personagens que frequentavam a turma, como Leon Trotsky e Frida Kahlo.
Além de uma história do movimento surrealista vista pela lente onírica, Nick Carter e André Breton também é uma excelente reflexão sobre criação, inspiração, integridade artística e o destino das obras ao longo do tempo. Pois, conforme afirma o professor e pesquisador Marcelo Jacques de Moraes no posfácio exclusivo para esta edição, “o que faz o ouro do tempo, aquilo que Breton chamou um dia de ‘beleza convulsiva’, ou de ‘maravilhoso’, não é o que se pode vir a encontrar ao fim de uma procura, mas a intensidade e a energia vitais que se disseminam, e cujos rastros se materializam ? se ‘acumulam’ ? no contexto da própria procura”. Além deste complemento, a primorosa edição da DarkSide® Books, inclui um glossário escrito por Ameli Jannarelli, colagista e editora da 100/cabeças, responsável pelo resgate fundamental de edições surrealistas.
Uma exuberância visual, uma narrativa gráfica que desafia os limites do real e do imaginário, Nick Carter e André Breton apresenta aquilo que de melhor a arte sequencial consegue produzir, refletindo sobre o ato criativo e deixando no leitor uma vontade de seguir se debruçando por esse universo onírico e lúdico que o movimento surrealista produziu como poucos no século XX.