Crítica literária não é contabilidade, dizia Samuel Beckett. O despovoador 1970 e Mal visto mal dito 1981, dois de seus textos tardios reunidos neste volume, diversos, mas igualmente essenciais e radicais, o cobrem de razão. Obrigam todo leitor, crítico ou não, a abandonar de vez o maniqueísmo do preto no branco, repensando a utilidade de esquadro e compasso. Convidam a ingressar na suspensão angustiada do cinza, lusco fusco em que o irlandês autor de Godot sempre esteve em casa. Econômica e tensa, para melhor acomodar o caos da experiência moderna, a obra final beckettiana rechaça qualquer simplificação. Uma fenomenologia da percepção e uma arqueologia do saber aproximam O despovoador, distopia que ecoa o Inferno dantesco, e Mal visto mal dito, janela e réquiem para uma velha enclausurada. Nos rastros desses textos ficcionais, autor e leitor percorrem tentativas de explorar um labirinto muito peculiar, o manicômio do crânio, consciência profunda ou abismos de inconsciência, onde vontade expressiva e vestígios do mundo se combinam em corredores de linguagem mais ou menos triunfante, mais ou menos arruinada. Renunciar à ilusão do controle fio de Ariadne com o qual acenava, sereno, o narrador clássico e examinar as condições dessa falência moderna, por certo, e mediada pela onipresença de um olhar investigativo cioso de si, observador e observado é para onde aponta a narrativa beckettiana madura, a da última pessoa narrativa, trabalho das três últimas décadasde sua vida.
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L002-9788533624405 |
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Autor |
Samuel Beckett |
Editora |
WMF MARTINS FONTES |
Idioma |
PORTUGUÊS |
Encadernação |
Brochura |
Páginas |
112 |
Ano de edição |
2008 |
Número de edição |
1 |