• Guerras civis

SINOPSE
Sete temas diferentes em sete capítulos interligados e atravessados pela dramaturgia disruptiva de Heiner Müller, um dos maiores nomes do teatro contemporâneo. Guerras Civis: Ilhas da Desordem de Heiner Müller expõe o desafio que a palavra impressa propõe ao teatro moderno, ao mesmo tempo que demonstra a capacidade pedagógica e libertadora que as formas de enfrentar esse desafio assumem. O livro traz a tradução para o português de uma peça curta do dramaturgo alemão, e em seguida aborda a relação estética entre o vanguardista Müller e Gotthold Ephraim Lessing, pensador alemão do século 18, em certa medida, um antecipador do romantismo. E ainda detalha a experiência da própria autora numa montagem com seus alunos-atuantes

QUARTA-CAPA
Em Guerras Civis: Ilhas de Desordem de Heiner Müller, Ingrid D. Koudela nos descortina o desafiador, e por vezes caótico, percurso de transformação da palavra escrita que se desdobra no tempo e no espaço cênicos em oralidade viva e gestual, ao mesmo tempo que nos introduz à obra do grande dramaturgo alemão Heiner Müller (1929-1995), e à pedagogia teatral.
Partindo de Vida de Gundling Frederico da Prússia. Sono Sonho Grito de Lessing. Um Conto de Horror, de Müller, traduzido na íntegra para esta edição, Ingrid Dormien Koudela expõe o caráter performativo de sua escritura, no qual intertextualidade e desconstrução constituem-se como método de pesquisa e pedagógico, dando ampla liberdade a atuantes e encenadores. Esse aspecto “radicalmente democrático” do fazer teatral tem no coletivo Ói Nóis Aqui Traveiz, de Porto Alegre, também aqui abordado, um dos seus expoentes. A autora aponta para princípios estéticos similares em Müller e Oswald de Andrade, tanto conceitualmente, na antropofagia intelectual e na representação paródica, como nas escolas estéticas a que se filiaram. Nos sete capítulos deste livro, o leitor testemunhará numa visão prismática o valor da encenação como prática pedagógica e o valor do teatro como arte libertária.

DA COLEÇÃO
A coleção Perspectivas em Cena reúne textos e pesquisas ligados à pedagogia e à prática teatral em todas as suas manifestações, podendo envolver qualquer área que atravesse ou que traga subsídios técnicos para uma montagem teatral.

DA CAPA
Imagem da capa: desenho inspirado em cena da peça Sono Sonho Grito de Lessing presente nesta edição. Um cemitério de automóveis e um busto de Lessing que tenta se desvencilhar de um monte de areia onde está preso.

TRECHOS
Heiner Müller
DE VIDA DE GUNDLING FREDERICO DA PRÚSSIA
FREDERICO GUILHERME (ri): Toma por exemplo de como tratar os eruditos. Deve aprender a arte de reinar quando eu consinto, como diz o pregador da corte, com meu Deus, ou com o nada. Encurtar as patas do povo, à besta desdentada. Fazer a inteligência de imbecil para que o povaréu não chegue a ter ideias. Lembre-se disso quando andar por aí empolado com seus trastes de tragédias. Eu quero que se torne homem. Está novamente roendo as unhas? Vou lhe mostrar.

SONO SONHO GRITO DE LESSING
Meu nome é Gotthold Ephraim Lessing. Tenho quarenta e sete anos de idade. Fiz o enchimento de uma ou duas dúzias de bonecos com serragem que era meu sangue, sonhei um sonho de teatro na Alemanha e refleti publicamente sobre coisas que não me interessavam. Isso agora acabou. Ontem vi sobre a minha pele uma mancha vermelha, um pedaço de deserto: a morte inicia. Ou melhor, se torna mais rápida. Devo dizer que estou de acordo com ela. Uma vida é o suficiente. Vi surgir uma época após a outra, de todos os poros sangue, merda, suor em cada uma delas. A história cavalga sobre cavalos mortos para o seu destino. Eu vi o inferno das mulheres. A mulher na forca. A mulher com os pulsos cortados. A mulher com overdose SOBRE OS LÁBIOS DE NEVE. A mulher com a cabeça no fogão a gás. Por trinta anos tentei ficar distante do abismo através de palavras, doente com o câncer do pó dos arquivos e da cinza que esvoaça dos livros, amordaçando meu crescente asco pela literatura, incendiado por minha saudade crescente pelo silêncio. Invejei surdos-mudos pela sua quietude durante a falação nas academias. E nas camas das muitas mulheres que não amei, pelo seu coito mudo. Começo a esquecer de meu texto. Sou uma peneira. Cada vez mais palavras passam por ela. Logo não ouvirei nenhuma outra voz além da minha, que busca por palavras esquecidas.

Autora
OS ATUADORES DA PAIXÃO
Em uma sociedade na qual o próprio teatro se tornou uma indústria e a literatura sua matéria-prima, permanece a proposta brechtiana de um modelo de educação político-estético e experimentação teatral que procura gerar novos meios de produção. Transformar a sociedade por meio do teatro significa modificar as estruturas do teatro, que são um reflexo das estruturas da sociedade. Assim como anuncia Brecht, a apropriação dos meios de produção artísticos é necessária e importante para o processo de emancipação do teatro e do público.

O TEXTO COMO MODELO DE AÇÃO NO JOGO TEATRAL
O conceito de handlungsmuster (modelo de ação) está relacionado a processos de aprendizagem como espaço em obra:
• modelo como exercício artístico coletivo que tem por foco a investigação das relações de homens entre homens através da linguagem gestual, como sistema de representação de sentidos;
• modelo como texto que é objeto de imitação.
Seriam inconvenientes textos à base de problemas ou situações históricas ou atuais. A partir de seu objetivo, que é favorecer um processo de conhecimento, as peças didáticas não podem examinar uma realidade específica na sua totalidade ou representá-la. Se as entendermos como modelo de ação, como investigação didática, na qual estão envolvidos mestres e aprendizes, elas necessitam ter certo grau de abstração que permita a experiência do saber fazer ao fazer saber.
Embora o modelo de ação repouse sobre a forma poética da dramaturgia da peça didática, a forma é atualizada através da investigação coletiva. A combinação entre a parte fixa (texto poético) e a parte móvel (jogo teatral) propõe que o controle sobre a aprendizagem não ocorra de forma fechada ou previsível. Embora as questões suscitadas pelo texto constituam uma moldura, o modelo de ação é tematizado pela parte móvel, conferindo assim autonomia na aprendizagem.

SUMARIO
Introdução
1. Vida de Gundling Frederico da Prússia. Sono Sonho Grito de Lessing. Um Conto de Horror [Heiner Müller]
2. “O Torso de Lessing”
3. Sobre a Poética do Fragmento em Müller
4. Os Atuadores da Paixão
5. Viagem de Heiner Müller ao Brasil
6. O Texto Como Modelo de Ação no Jogo Teatral
7. O Jogo Teatral Com Brecht e Müller: Experiência de uma Reflexão
Bibliografia

Código: L004-9786555050646
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Autor Reimund Heiner Ingrid Dormien; Müller
Editora PERSPECTIVA
Idioma PORTUGUÊS
Encadernação Brochura
Páginas 128
Ano de edição 2021
Número de edição 1

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